Monday, February 25, 2008

O próprio tempo transcorrido

[...]o confronto com uma obra que perante nós regressa após muitos anos implica também o nosso próprio diferencial de tempo; o filme ["Profissão: Repórter] até é materialmente o mesmo, eu até sou um espectador que o viu quando da estreia, mas entretanto houve o meu próprio tempo transcorrido e o filme interpela-me de modo muito diferente.

Augusto M. Seabra

in Antonioni ou o Cinema, Público, 11-09-2006

Apetece-me destacar a importância de rever filmes, com certeza, prática comum a qualquer amante de cinema. Rever para confirmar e para mudar de opinião, claro, mas sobretudo, e por isso cito esse trecho de Seabra que para aqui andava perdido, para sentir os filmes de uma outra forma, para fazer sentir ao filme a mutação da nossa condição de espectador.

Sunday, February 24, 2008

Avi Mograbi

Já tinha falado do "Detail" (2004) uma vez. Não está no You Tube, mas está lá algo chamado "Detail 2 e 3", que, escreve-se na introdução ao vídeo, foi uma preview de obra a apresentar num qualquer festival vídeo-arte. Em todo o caso é muito bom e vale a pena ver pelas mesmas razões de "Detail", não chegando ao nível deste. Para além disso, não é cineasta cuja obra se arranje facilmente.

stay inside 'til somebody finds us

Saturday, February 23, 2008

Vítor Gonçalves

É um exemplo de ética, sim senhor. Não resisto a entrar nos territórios da psicologia e pergunto-me qual é o estado de alma de Vítor Gonçalves, alguém para quem, cito de cor, "o facto de não filmar não significa que a minha vida não seja o cinema, que não pense em cinema a toda a hora". Isto é, até que ponto essa resistência por uma ética o afecta?

Quanto ao novo filme, depois do entusiasmo de ontem, veio a mim um pensamento mais pessimista: que vida terá um novo filme de Vítor Gonçalves? De quem? Estaremos cá para ver o filme, alguns, e com certeza lutaremos por ele se revelar os sentimentos de "Uma Rapariga no Verão".

O filme. Não sei se deveria arriscar a escrever qualquer coisa, não só porque me surgiu como um filme vindo de lado (cinematográfico) nenhum, mas também devido à má cópia apresentada, causando imensa perturbação no visionamento, sobretudo ao nível do som (perdi alguns diálogos). Porém, a mise-en-scène de Gonçalves é notável na forma como transparece essa ideia chave do filme que é o sentimento de mal estar. Isabel, centro do filme, é o expoente desse mal estar, como se qualquer espaço em que estivesse fosse claustrofóbico. Esse incómodo parece-me maior nos espaços interiores, não sendo de estranhar que seja nos exteriores que se abram brechas para uma eventual "saída" (a muito falada sequência do passeio e subida ao muro é exemplar). Para não falar daquele último plano a que será fácil chamar misterioso. Porém, não serão todos os filmes em que a elipse é dominada misteriosos? Talvez não sejam assim tanto, talvez peçam apenas mais alguma disponibilidade ao espectador. Por isso quero rever o filme e não será esta uma má oportunidade para fazer mais um aceno à Midas.

Friday, February 22, 2008

De que lado se está.

Mas, no fundo, não é precisamente isso que esperamos da televisão: mais do mesmo que já conhecemos para aconchegar-nos quando chegamos do trabalho?

Jorge Mourinha

Ando aqui a reler a pequena crónica do Jorge Mourinha a ver se percebo se esta frase é irónica ou não. Se é, a ironia está demasiado bem dissimulada para eu a perceber. Se não é, tenho a dizer que não, não é isso que eu espero da televisão portuguesa. A televisão portuguesa não me aconchega, a televisão portuguesa destapa-me. Destapado, apanho frio. Apanhando frio, fico doente e inerte - e eu não quero isso para mim.

Wednesday, February 20, 2008

(falta de) Concentração

Não me levem tão a sério

Este post motivou esta resposta do Tiago Costa, no Claquete. Assim, vou tentar responder, de forma sucinta, a alguns pontos para que isto não se torne uma polémica.

Mas que polémica, digo eu a mim próprio, se eu nem estava a discutir o que quer que fosse. Aquele post evidenciava isso? Não era minha intenção. Não gosto de Ridley Scott, mas para fundamentar isso de forma mais justa, teria que rever filmes e, eventualmente, ver mais alguns que não vi. Daí que, mesmo saudando o teu post, acho bem que se defenda os realizadores de que se gosta, não posso discuti-lo.

O que acho estranho, Tiago, é que tenhas levado o meu texto tão a sério. Fico a pensar que percepção tem a comunidade leitora do Phantom Limb sobre o Daniel Pereira para levar a sério a minha depreciação de um filme que ainda não existe. Se fiz isso foi para impor uma posição acerca do facto de um realizador de que não gosto ir fazer um filme adaptado de um romance do escritor de que eu mais gosto. Lá fui brindado com "preconceituoso". Quanto a isto não há volta a dar: a blogosfera não tem sentido de humor e prima pelo bom comportamento. Diria mesmo que a blogosfera vai votar Sócrates. Nem o facto de eu ter feito a ressalva de não ter visto "Alien" (facto que coloca dúvidas ao outro comentador quanto ao eu gostar ou não de cinema...) e precisar de rever o "Blade Runner" me safou. Foi uma provocação e espero provocar mais vezes.

Quanto ao Ridley Scott, e àquilo que posso minimamente discutir, tenho a dizer que não gosto dessa sequência do "Gladiator", em que na sua maioria só existem os efeitos sonoros da movimentação e embate de duas espadas, quando algo acontece não há problema em usar o ralentí (e o seu uso é feio) e facilmente se coloca a musquinha da ordem. É isto que eu vejo e o que eu vejo não é violento, seco ou crú. Quanto às adaptações, poderia até aproximar-me àquilo que escreveste, afinal, como diz muito bem o João Mário Grilo, "o cinema não filma livros". Mas regresso à ideia de que o post foi uma provocação vinda de um sentimento pessoal. Não me levem tão a sério.

Tuesday, February 19, 2008

Raise our heavenly glasses to the heavens!

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The National, 11 de Maio na Aula Magna

Manchete

"Sepsi Cola" é, talvez, o melhor/pior trocadilho que A Bola produz desde que Fernando Couto bisou ao serviço do Parma, aí há uns 4 anos, e que mereceu o título "Biscouto".

Monday, February 18, 2008

Que final?

Depois de ter visto "On Dangerous Ground" (Nicholas Ray, 1952) esta manhã, só li este texto do Tiago, lembrava-me de ele ter escrito algo sobre o filme há pouco tempo. Dava-me jeito uma folha da cinemateca escrita pelo Bénard para contar a história da produção (e para o resto, claro, ninguém escreve como ele). Isto para falar no final do filme. Diz o Tiago que o Ray não ficou contente com o resultado e eu imagino que tenha que ver com o final. Não acredito que o happy end que chega já depois do personagem de Ryan regressar à cidade, mesmo que perverso, seja de Ray. Só pode ser da RKO. Se me disserem o contrário, não acredito. Repito: o happy end é perverso, sim, mas ainda assim é demasiado happy para o que conheço de Ray. Para todos os efeitos, o filme é excelente.

Sunday, February 17, 2008

It was the nearest thing to heaven!



Já pus o link uma vez e é este texto do João Lopes que se tem que referir quando se fala da última sequência de "An Affair to Remember" (Leo McCarey, 1957). Toda a sequência é contenção, desde os actores à câmara. Aliás, a câmara movimenta-se mais quando o segredo é revelado - aquele breve, mas espantoso travelling que passa nas costas de Grant para enquadrar Kerr. Antes disso, continuam os geniais diálogos que percorrem todo o filme (dos mais geniais diálogos já escritos para cinema), terminando com uma leve subida de tom sem, no entanto, deixar de conter o happy end.

- If you can paint I can walk- anything can happen, right?
- Yes, darling, yes, yes, yes...

Programação

Saturday, February 16, 2008

High Plains Drifter (Clint Eastwood, 1973)

Em "High Plains Drifter" há um estranho, sem nome, protagonizado por Eastwood himself claro, que chega a uma localidade de nome Lago. Impõe-se de forma violenta após ter sido recebido de forma violenta. Carrega consigo um peso do passado, neste caso um chicoteamento brutal de que foi alvo. Lago tem um problema com uns fora da lei; os seus habitantes, vendo que o estranho os pode ajudar, pedem-lhe ajuda em troca de tudo o que quiser da cidade sem custos. Daqui a cidade entra num sistema político a que não será muito exagerado chamar comunismo, já que o estranho, qual Estaline, ordena como hão de ser utilizados os bens privados em favor da comunidade. Isto faz com que a comunidade se vire contra o estranho e, a certa altura, há um caos que apenas ligeiramente se atenua para se dar cabo dos fora da lei. Grande descrição.

Importa no filme a economia com que Eastwood filma tudo isto. É um western série B saído da Hollywood clássica com a unidade de espaço a ajudar o sentimento de crispação que passa pelo filme. Isto porque o caos referido acima é a consequência desta crispação. Daqui pode entender-se o começo de alguns dos temas caros a Eastwood. O isolamento do personagem, mesmo quando em comunidade, e a descrença num mundo, se não perfeito, pelo menos razoável - impossível, claro, veja-se a reacção da comunidade. Não há ainda a fluência narrativa que se atingiria mais tarde (algumas coisas que reconhecemos de Eastwood parecem vir em blocos, como se agora quisesse mostrar uma coisa, depois outra), mas já há um golpe de asa (mesmo descontando o truque de argumento) de uma vingança silenciosa apenas mostrada no último plano - que é, basicamente, o mesmo último plano de "Dirty Harry". Esqueça-se "Play Misty For Me", "High Plains Drifter" é o primeiro filme de Clint Eastwood.

Um post sobre Ridley Scott

Caramba... um post sobre Ridley Scott. Isto porque já li o primeiro capítulo de Blood Meridian, de Cormac McCarthy. Ora leiam o terceiro parágrafo do romance:

The mother dead these fourteen years did incubate in her own bosom the creature who would carry her off. The father never speaks her name, the child does not know it. He has a sister in this world that he will not see again. He watches, pale and unwashed. He can neither read nor write and in him broods already a taste for mindless violence. All history present in that visage, the child the father of the man.

Pensei logo para mim: "desde quando é que o Ridley Scott sabe filmar uma coisa assim?" Depois pensei: "mas eu nem vi muitos filmes dele, para que é que estou aqui a falar?" Lá fui ao IMDB e descobri que já vi uns quantos afinal. Não vi o "Alien" (e porque não aproveitar este post para confessar que nunca vi nenhum filme desta série), mas vi o "Blade Runner", que não achei nada de especial, mas precisa de uma revisão. Seguindo cronologicamente, vi o "Thelma & Louise", para aí o mais patético filme do mundo e uma ofensa às mulheres, e vi todos os filmes seguintes até "Black Hawk Down" inclusivé. Daí para a frente, nada. E lembrando-me dos seus filmes, e nunca nos lembramos de tudo, não me lembro de uma cena seca de violência. Digo, então, após dez páginas, mas sem hesitações: Blood Meridien não pode ser feito por alguém que não sabe filmar de forma crua e seca; o filme que Scott vai fazer com a adaptação é uma merda. Bola negra.

Friday, February 15, 2008



Thursday, February 14, 2008

Multiplexes

Wednesday, February 13, 2008

Vernacular anti-elogio

Em primeiro lugar, a utilização do "vernacular anti-elogio" não é forçada, é algo que me sai naturalmente em relação a um filme que me ofende.

(E é curioso que tenha sido o Sérgio a comentar em seguida, ele que ouviu a minha ira no final da exibição do filme no Indie 2006 – estás lembrado?)

Mais do que apontar uma falha em aspectos técnicos, narrativos ou demais gramaticais, ofendem-me os sentimentos com que Blaufuks parte para trabalhar o seu objecto. Como diz o Sérgio, Blaufuks trabalha a confirmação duma ideia pre-existente. Pior: fá-lo com todo o seu poder de sujeito-cineasta. Por outras palavras: não há um plano neutro. Não que a neutralidade seja condição obrigatória (embora bastante apreciável), mas quando o filme se fecha numa visão única, e a meu ver primária, sobre o objecto, andamos perto de algo a que não tenho problemas em chamar fascismo. Lembro-me de planos horríveis sobre pessoas a fazer piqueniques na mata ou as constantes repetições de planos que encontravam as moradias, do ponto de vista da arquitectura, mais bizarras. Todos esses planos emanam escárnio sobre uma cultura, partindo, porém, do concreto, do individual mesmo. Quem é Blaufuks para pensar ter esse direito? Com certeza, o cosmopolitismo de Blaufuks faz com que ele pense isso. É curiosa a forma como uma pessoa bastante culta, como julgo ser Blaufuks, pegue no dispositivo do cinema para, na maior das facilidades, cair na sua faceta mais poderosa e perigosa. Ao recusar o fora de campo ao seu filme, Blaufuks impede que o seu filme saia da impressão pessoal para um pensamento estrutural daquilo que filma. Isto faz-me voltar a essa ideia principal e ofensiva: “Um Pouco Mais Pequeno que o Indiana” como filme fascista.

Sunday, February 10, 2008

Estado do documentário português

Mais um Panorama é de louvar porque será dos poucos acontecimentos em que, creio, haverá discussão em torno do cinema. Infelizmente, não posso ir. Ainda assim recomendo "À Flor da Pele" (Catarina Mourão), "Pé na Terra" (João Vladimiro) e "Encontros" (Pierre-Marie Goulet) como excelentes filmes que devem ser vistos. E espero que ninguém vá ver o do Blaufuks, sim, sala vazia para o mais filho da puta de todos os filmes portugueses.

Distribuidores

Vale a pena espreitar esta lista.

Saturday, February 09, 2008

Para Godard

Monday, February 04, 2008

10 filmes dos 80's

Incentivado pelo Tiago e postado sem pensar muito no que pode faltar ou na ordem.

1- E.T., Spielberg
2- Raging Bull, Scorsese
3- Stranger Than Paradise, Jarmush
4- L'Argent, Bresson
5- Once Upon a Time in America, Leone
6- O Sangue, Costa
7- Ana, Reis e Cordeiro
8- Recordações da Casa Amarela, Monteiro
9- City of Sadness, Hsien
10- Dead Ringers, Cronenberg

Sunday, February 03, 2008

Duas notas sobre "Daqui P'rá Frente"

"Daqui P'rá Frente" (Catarina Ruivo, 2007) incomoda-me devido à sua vontade de argumento e devido à masturbação de Rui Poças.

O filme começa muito bem com uma sequência de grande crispação entre o casal de personagens principais: a dificuldade de manter uma relação entre pessoas de ritmos e interesses diferentes transforma-se, rapidamente, na agressividade verbal dos intervenientes, incapazes de encarar o mal estar de outra forma. Depois disto, não há espaço para o casal, cada um com o seu sub-plot, com personagens secundárias importantes e tudo, chato no caso dela, mesmo ridículo no caso dele. Ambos têm o mesmo tempo de antena, fazem as suas vidas e, no final, círculo feito, acabam juntos em cima de uma mota. Apetece perguntar porque é que isto é um filme de King Triplex e não de Lusomundo, mas já sabemos as regras do jogo.

A iluminação do filme é bonita, sim senhor, mas a meio já chateia. Isto já estava previsto nesse horrível e masturbatório primeiro plano em que Adelaide de Sousa se senta à porta do prédio onde dorme a noite toda - um plano fixo de um ou dois minutos em que a luz se vai alterando para dar a entender a personagem dormiu um soninho de horas. Para que é que se perde tempo e trabalho com estas merdas, se não há nada no plano para além de virtuosismo?

Friday, February 01, 2008

Who is he?

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Decido pôr este still no ambiente de trabalho do computador do trabalho. Não muito tempo depois, a minha chefe, portuguesa, passa por trás de mim, olha, volta atrás e remata: "Who is he? He looks like a gangster." Tudo dito.

Aproveita-se este post para falar neste blogue. Só pode ser o regresso do José Oliveira.