Anormais?
De resto, se uma preocupação tive, e poderia ser um princípio moral, foi indeterminar e destruir a fronteira da normalidade e da anormalidade, sem «parti-pris», mas pela razão simples de me estar no sangue e na inteligência, até porque estou convencido que grande parte dos anormais estão cá fora e muitos normais, hospitalizados. Classifico mesmo essa divisão, em extremo, como racista. É um dos grandes problemas do nosso tempo, em qualquer parte do mundo, e tentar destruir esse preconceito era, para mim, muito importante.
António Reis
Não para continuar o post do outro dia, mas para dizer que acabei de ver "Titicut Follies", primeiro filme de Fred Wiseman, datado de 1967. Diz Wiseman que o resultado final é decepcionante devido à ingenuidade com que partiu para o projecto, pensando que com o filme poderia mudar alguma coisa, neste caso a forma como os internados do hospício do Massachusetts Correctional Institute eram tratados. Dependerá de cada um concordar ou discordar dele, não é isso que está em questão. Porquê? Porque a qualquer discurso externo se sobrepõe, a meu ver, o discurso do filme. "Titicut Follies" não me parece também o melhor exemplo para evidenciar a negação do termo Cinema Verité por parte de Wiseman. Isto porque me surgem como momentos mais fortes deste filme aqueles em que a câmara está, de facto, lá. O diálogo (se bem que "diálogo" seja um termo incorrecto quando um dos intervenientes não quer ouvir, mas apenas negar o outro) entre o internado que vemos no filme a defender a sua condição sã e um funcionário da instituição (não sei especificar a sua função, mas tem poder) é sintomático. Voltando à questão do discurso do filme: são diálogos como o atrás referido ou planos como aquele em que um director olha escarniamente para o mesmo doente que põem em causa aquela instituição - se Wiseman tentou que houvesse uma mudança, o filme prova que ele o fez de forma exímia. Vale a pena referir ainda que a forma "wisemaniana" seca (não há narração ou entrevistas) até ao tutano não deixa nunca o filme aproximar-se de qualquer demagogia. Se Wiseman faria melhores filmes em diante, sempre com base na relação do indivíduo com a instituição também não me interessa - "Titicut Follies" é um filme gigante.
António Reis
Não para continuar o post do outro dia, mas para dizer que acabei de ver "Titicut Follies", primeiro filme de Fred Wiseman, datado de 1967. Diz Wiseman que o resultado final é decepcionante devido à ingenuidade com que partiu para o projecto, pensando que com o filme poderia mudar alguma coisa, neste caso a forma como os internados do hospício do Massachusetts Correctional Institute eram tratados. Dependerá de cada um concordar ou discordar dele, não é isso que está em questão. Porquê? Porque a qualquer discurso externo se sobrepõe, a meu ver, o discurso do filme. "Titicut Follies" não me parece também o melhor exemplo para evidenciar a negação do termo Cinema Verité por parte de Wiseman. Isto porque me surgem como momentos mais fortes deste filme aqueles em que a câmara está, de facto, lá. O diálogo (se bem que "diálogo" seja um termo incorrecto quando um dos intervenientes não quer ouvir, mas apenas negar o outro) entre o internado que vemos no filme a defender a sua condição sã e um funcionário da instituição (não sei especificar a sua função, mas tem poder) é sintomático. Voltando à questão do discurso do filme: são diálogos como o atrás referido ou planos como aquele em que um director olha escarniamente para o mesmo doente que põem em causa aquela instituição - se Wiseman tentou que houvesse uma mudança, o filme prova que ele o fez de forma exímia. Vale a pena referir ainda que a forma "wisemaniana" seca (não há narração ou entrevistas) até ao tutano não deixa nunca o filme aproximar-se de qualquer demagogia. Se Wiseman faria melhores filmes em diante, sempre com base na relação do indivíduo com a instituição também não me interessa - "Titicut Follies" é um filme gigante.
1 Comments:
"filme gigante" é uma expressão bem tola.
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