Saturday, July 26, 2008

L'Albero degli zoccoli

Vejo mais cinema em que acredito profundamente: "L'Albero degli zoccoli" (Ermano Olmi, 1978). Lembro-me de Vittorio De Seta ao ver o filme de Olmi e não é só porque o primeiro está fresquinho na minha cabeça: "L'Albero degli zoccoli" está entre a tentativa épica de "Banditi a Orgosolo" e a justeza ímpar que as curtas-metragens anteriores de De Seta evidenciavam. Também Olmi encontra um espaço onde se vai situar e trabalhar. São camponeses da região de Lombardo, no norte de Itália, os protagonistas deste filme. A acção decorre no final do século XIX - o que, vendo o filme, e essencialmente a primeira meia hora em que Olmi filma aquelas cinco famílias como se fossem as únicas a habitar o mundo, nos faz abandonar a importância de nos situarmos num tempo histórico preciso em detrimento de noções mais abertas: o que foi, o que é, o que não será.

Abandonadas num mundo antigo, aquelas famílias sobrevivem a violência do trabalho e da paisagem com os afectos de uma comunidade unida. Sabe tão bem ver um ganso verdadeiro a ficar sem cabeça ou a matança de um porco e todo o seu guinchar. Hoje, viria a insuportável escumalha a criticar os maus tratos aos animais - essa escumalha não conseguiria nunca ver a camponesa a dizer aos homens para terem cuidado, que "estavam a matar o porco ainda antes de o matar". Quanto mais ver como Olmi mostra a sua indecisão face à situação ao alternar entre planos próximos e muito distantes. Sabe tão bem ver um avô a ensinar o segredo do cultivo do tomate à neta. Sabe tão bem ver um casamento em que o ritual, de facto, importa.

Acima de tudo, comovi-me com aquele que pode considerar o protagonista principal, Batisti, e a sua relação com o filho mais velho, o único que tem hipótese de estudar. A indecisão do pai, logo no princípio, de deixar o filho ir à escola, algo inédito, é seguida pelo apoio (muito por culpa dos conselhos do Padre - não esquecer que a religião é papel fundamental); pelo receber o filho em casa no regresso deste da escola (a forma como Olmi nunca dá duração à caminhada até à escola, mas consegue filmar a distância brutal desta através da distância de onde filma um plano, que tem um miudo de seis anos lá dentro, é absolutamente notável), o tirar dos sapatos e das meias e o aquecer dos pés na lareira; pelo esconder à mulher o facto do seu filho ter partido o tamanco; pela maneira como sabe que tem que arranjar outro tamanco ao filho mesmo que isso seja a sua perdição; pela maneira como o filho passa aos pais o que aprendeu na escola e no orgulho destes.

O que importa ver no trabalho de Olmi é a maneira como se evita a evidência de uma ideia que, claramente, está feita à partida, tentando, ao invés, justificá-la com o filme propriamente dito. Dessa forma, a estrutura do filme sem um princípio, meio e fim claros, é antes composta por sequências com grande força individual, antes encadeadas de forma lógica - a forma possível para a força daquela matéria. Justeza, numa palavra.

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