Sunday, August 19, 2007

Lo Chiamavano Bulldozer

Aqui há tempos, em conversa com o Miguel dizia-lhe que estava a sacar o "Lo Chiamavano Bulldozer" e ele disse-me qualquer coisa como "deves estar a brincar", ou coisa parecida, já não me lembro bem. Perguntei-lhe se ele via Welles desde puto, ao que ele muito bem respondeu que não, mas quando chegou a Welles não voltou ao Bud Spencer. Na altura pensei "o gajo tem uma certa razão."

Mas lá saquei o filme e revi-o após muitos anos; a última tinha sido na Sic, aí em meados da década de 90. "Lo Chiamavano Bulldozer" foi um filme que vi muitas vezes na Alemanha, quando era puto, na década de 80 - o meu pai gostava muito do Bud Spencer e este era um dos que ele tinha gravado, como todos da televisão alemão, dobrado. Daí que rever agora o filme dobrado em italiano seja estranho. "Lo Chiamavano Bulldozer" para mim sempre foi "Sie nahnten ihn Mücke", como nas imagens abaixo.

É um filme pouco importante se o virmos racionalmente. Suponho eu, porque nem agora o consegui fazer. Isto é cinema bem popular e acho que deste cinema popular já não se faz. Se se fizesse os putos seriam menos estúpidos e os velhos ainda ligariam alguma coisa ao cinema. Desde alguns diálogos bem conseguidos (o que eu me ria com 5 ou 6 anos com o empregado da taverna a perguntar ao Spencer se queria a omoleta com um ou dois ovos, e ele a responder com 12), até às sequências de porrada sempre encenadas em registo absurdo (os uppercuts de Spencer que tiram as vítimas dos sapatos, por exemplo) até à criação de um personagem principal carismático. Mücke/Bulldozer é um ex-jogador de futebol americano que deixou de jogar por acreditar no desporto como algo puro, coisa que ele já não veria acontecer. Alheou-se do mundo, comprou um barco e foi para o mar. O seu rosto é daqueles que não mudam de expressão: os olhos muito fechados, sorriso muito fino, aquele ar de cansado que traz o passado para o presente (o próprio título do filme conjuga o verbo no passado). A banda sonora bem canta:

But for a man he's just a good boy
just a good boy with a heart of gold
who likes to go his own way
stay far away from the world.

Por isso é com ar cansado que ele treina a equipa de permanent vacationers italianos (gajos que passam a vida na taverna, no jogo, a roubar, etc.) contra a do exército norte-americano. É também um filme contra a corporação, o exército mantém sempre o seu estatuto de poder, mas neste filme nunca vence. A equipa dos pequenos precisa apenas de fazer um ponto contra a dos grandes. O filme acaba assim:



Como se escreveu há tempos, e muito bem, há uma história do cinema do coração. A minha está cheia de Bulldozers, nunca os recusarei. Sem eles não teria chegado à outra história do cinema.

4 Comments:

Blogger Ricardo said...

Belo texto sobre um guilty pleasure. Também por aí anda imenso cinema ou até mais do que em alguns filmes de autor. Alguns guilty pleasures meus: Star Wars, Robocop, Conan, James Bond.

12:18 PM  
Blogger Hugo said...

...somos 3. Gostei do vídeo auf Deutsch :-)

5:23 PM  
Blogger Capitão Napalm said...

Para quem, como eu, já fez uma doube bill com "O Destino", de Chahine, e o glorioso "Comando", só posso aplaudir este texto. Os "guiltys" são uma coisa muito necessária.

9:34 PM  
Blogger gonn1000 said...

Belo texto, Daniel, concordo em absoluto, ainda que não necessariamente em relação aos filmes do Bud Spencer, dos quais tenho uma memória muito vaga.

11:46 AM  

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