Which cut is the film?
"A mutabilidade de objectos que se consideravam fixados na sua existência material tornou-se entretanto facto corrente com a edição em dvd. “Director’s cut” tornou-se mesmo também num chamamento promocional. Com frequência os complementos de um dvd incluem não só o “making of” que já se tornou corrente, ou os comentários, como também a possibilidade de percepção de diferentes montagens de um mesmo filme. Já se torna mesmo recorrente que versões mais longas de um filme são destinadas logo directamente à edição em dvd, enquanto montagens mais aproximadas de durações standard são destinadas à apresentação no circuito de salas. Dito de outro modo, podemos mesmo interrogarmo-nos se no próprio processo de feitura de uma obra, na sua poiesis, não vai cada vez mais ocorrendo o cálculo das diferentes estesis, dos modos diferenciados de disponibilização e percepção também."*
in A obra de arte na era da sua mutabilidade técnica, Augusto M. Seabra (Texto completo aqui)
Já o João Mário Grilo dizia assim num artigo do Y, onde se fazia um balanço de cinema do ano de 2005:
"Acho que isso é marginal e ponho mesmo em dúvida se estamos a falar exactamente do tipo de espectador clássico do cinema. O cinema é um espectáculo de sala com as pessoas sentadas num sítio quietas e onde estão submetidas à própria regra daquele espectáculo. A partir do momento em que se sai da sala deixa de haver cinema. Uma pessoa pode ver filmes, mas não pode ver cinema na televisão. Isso não existe! O cinema necessita de do ecrã, da magem projectada e não da imagem reduzida, portanto, isso é um outro tipo de espectáculo, um outro tipo de relação das pessoas com a imagem e com os sons."
O cinema não vai morrer, mas é bem possível que se venha a mutabilizar, dando ou não origem a uma nova forma de arte, independente do cinema. Com a internet e as edições em dvd houve uma democratização que, por sua vez, alterou hábitos, como vemos, quer de consumo quer de criação. Em relação ao consumo, mesmo em decrescendo, haverá sempre os fiéis à sala, que, em maior ou menor quantidade, manterão a chama viva. Em relação à criação, o caso é mais complexo. Se haverá também sempre quem se insira no cinema como o conhecemos, começam a existir híbridos estranhos com que é preciso lidar. Isto para estarmos preparados quando a geração internet nos enfiar num lar e começar a tomar conta desta merda.
*Carregado meu.
in A obra de arte na era da sua mutabilidade técnica, Augusto M. Seabra (Texto completo aqui)
Já o João Mário Grilo dizia assim num artigo do Y, onde se fazia um balanço de cinema do ano de 2005:
"Acho que isso é marginal e ponho mesmo em dúvida se estamos a falar exactamente do tipo de espectador clássico do cinema. O cinema é um espectáculo de sala com as pessoas sentadas num sítio quietas e onde estão submetidas à própria regra daquele espectáculo. A partir do momento em que se sai da sala deixa de haver cinema. Uma pessoa pode ver filmes, mas não pode ver cinema na televisão. Isso não existe! O cinema necessita de do ecrã, da magem projectada e não da imagem reduzida, portanto, isso é um outro tipo de espectáculo, um outro tipo de relação das pessoas com a imagem e com os sons."
O cinema não vai morrer, mas é bem possível que se venha a mutabilizar, dando ou não origem a uma nova forma de arte, independente do cinema. Com a internet e as edições em dvd houve uma democratização que, por sua vez, alterou hábitos, como vemos, quer de consumo quer de criação. Em relação ao consumo, mesmo em decrescendo, haverá sempre os fiéis à sala, que, em maior ou menor quantidade, manterão a chama viva. Em relação à criação, o caso é mais complexo. Se haverá também sempre quem se insira no cinema como o conhecemos, começam a existir híbridos estranhos com que é preciso lidar. Isto para estarmos preparados quando a geração internet nos enfiar num lar e começar a tomar conta desta merda.
*Carregado meu.
2 Comments:
Esta "mudança" começa a deixar-me assustado e triste...
:(
Não haverá num todo que chamas "geração internet" pessoas capazes de resistir? De amar a sala como espaço de santuário, de venerar o ecrã grande como a melhor das telas, de preservar, acarinhar e descobrir o cinema do tempo dos nossos avós e pais? Ainda hoje, existem pessoas que ouvem lp's. Sei que é diferente, porque uma sala de cinema é algo pensado para um colectivo e um disco de vinyl não. Mas a questão é: é possível conciliar o culto da sala com o usufruto das possibilidades do dvd, tal como é possível gostar de ouvir lp's e "sacar" mp3.
Porque deveremos desacreditar já aqueles que nos vão seguir nos trilhos fascinantes da cinefilia? Muitos dos "novos" que vejo me desapontam pelo váculo de ideias e de valores, pelo desinteresse pelos livros em papel e pela negação do prazer de ouvir música com memória, não apenas os efémeros hits da mtv. Alarma-me pensar na falta de memória voluntária de quem se recusa sem ter experimentado a ver filmes ditos "antigos", a deixar-se levar pelo mudo. Revolta-me as afirmações não fundamentadas de "seca". Mas acredito que entre uma massa de pessoas assim, há sempre almas grandes e abertas, capazes de se deixarem tocar e de continuarem o legado dos que descobrem nas salas e nos livros em papel um mundo novo onde também nos descobrimos a nós. Descobrir o passado, deixarmo-nos seduzir pelo muito que desse passado é presente faz parte do ser humano que sente e que pensa. Eu ainda acredito que haverão uns tantos afortunados que perpetuarão um mundo que alguns de nós já vêem condenado a um fim.
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